- Camilo Mota
Corpo, mente, espírito

Camilo Mota
Corpo, mente e espírito são uma composição da totalidade do ser humano. Esses três atributos têm sua própria potência, são diferenciados no modo de sua existência, e no entanto, quando unidos, dão forma a um conjunto único, singular, a que nos acostumamos chamar de eu.
O dificultoso para o homem é se libertar de sua identificação ao eu, porque em sua tendência à análise acaba por separar os três atributos sem perceber sua unicidade e os modos como eles se unem para formar o ser. Assim, o eu se confunde com o corpo quando a ele nos apegamos de modo a querer conservá-lo, por exemplo, sem a ameaça de sua finitude. Ou seja, o medo de morrer é uma expressão do apego à forma corpo. O eu pode se apegar à mente e acreditamos que somos o que pensamos de nós (ou o que os outros pensam de nós, ou por nós). Vivemos narrativas e histórias sobre um personagem que nós mesmos inventamos em nossos processos de identificação e subjetivação. E o eu ainda pode se apegar ao espírito, reconhecendo ali algo transcendente, levando o sujeito a um processo de busca espiritual, sem conexão com os atributos da realidade.
O eu verdadeiro, por sua vez, não é uma identidade, mas um processo, uma potência que varia no tempo e no espaço. Pode ter um nome, mas não é o nome que o define. Ele é a composição dinâmica de corpo, mente e espírito.
O corpo é a conexão direta com a terra e seus elementos. Se forma da água, dos minerais, das bactérias e vermes, da flora e da fauna. É uma dimensão de movimento em constante mutação, porque envelhece e morre. Retorna à terra de onde veio.
A mente se faz na palavra, no pensamento, na imagem. Precisa do corpo numa conexão direta com as funções vitais do sistema nervoso central, mas também pode se manter ativa ainda que essas funções estejam inativas temporariamente.
O espírito (ou alma) é o inefável, o que não pode ser nomeado (não é mente) nem tocado (não é corpo). Mas pode ser sentido nos dois atributos. A sensação mais táctil é a respiração. Por isso dizemos que a vida é um sopro. A respiração é a alma da vida que entra pelas narinas, toca o espírito interno do ser, e depois retorna para o "fora". A cada inspiração que fazemos estamos sentindo o espírito da vida que nos anima, é onde poderíamos dizer que estamos sendo tocados por Deus, a alma universal, ou que estamos respirando Deus. Esse espírito não é transcendente, mas imanente, porque está a todo momento vivendo através de seus atributos. No caso do homem, o corpo, a mente e o espírito são expressões da vontade divina ou espiritual, uma força cósmica que é em si mesma.
Quando o corpo morre, a mente também se dissolve, mas ambos permanecem no espírito, que continua seu movimento de composição com os corpos e mentes dos seres viventes. Algo desse eu verdadeiro provavelmente continua seu processo vital e permanecerá vibrando no campo da imanência. Toda literatura mística e religiosa se refere a esse processo, cada uma com uma narrativa consistente em seus princípios. Alguns falam de reencarnação, outros de dimensões e mundos espirituais. Ambas explicações oferecem caminhos para refletir e meditar sobre o propósito da vida humana na terra.
Independente da crença espiritual ou materialista que se tenha, encontraremos como fator determinante da vida e seus processos a harmonia a ser cuidada na composição do corpo-mente-espírito. Cuidar de si na melhor composição desses atributos já é um bom caminho para se viver.